Há 17 anos, Cooperativa de Agricultoras Familiares de Poço Fundo e Região conscientiza quanto ao papel protagonista da mulher no ambiente das coops.
Nada de só passar um cafezinho. Desde cedo, as mulheres de Poço Fundo (MG) se apropriaram do café não apenas para um agradável momento de degustação entre amigas. Elas viram no mercado o potencial de crescimento: do plantio à exportação.
Na década de 80, quando os cafeicultores de Poço Fundo iam às reuniões de negócios, eles estavam sempre bem acompanhados. Suas esposas, além de frequentarem aquela roda de relacionamentos, demonstravam muito interesse e participavam ativamente das decisões sobre os negócios familiares.
Cultivando esse envolvimento, as mulheres passaram a ocupar cada vez mais posição de destaque nos empreendimentos e assumiram poder de decisão e liderança naquela região. Foi assim que a Cooperativa de Agricultoras Familiares de Poço Fundo e Região (Coopfam) passou a ser pioneira na promoção da equidade de gênero, rompendo barreiras em um cenário tradicionalmente masculino.
De acordo com Vânia Pereira, presidente da Coopfam há sete anos, o objetivo nunca foi substituir os homens, mas sim somar e complementar esforços em um lugar que fosse ocupado também por mulheres.
“A Coopfam busca fazer um trabalho sutil, conscientizando sobre a importância de trabalhar juntos, homens e mulheres, para o fortalecimento de toda a comunidade cooperativista”, afirmou Vânia Pereira.
REPRESENTATIVIDADE FEMININA
O protagonismo das mulheres ganhou força, tornando a Coopfam uma inspiração para outras cooperativas e uma referência no papel transformador do cooperativismo. Em 2006, a coop formalizou o grupo “Mobi – Mulheres Organizadas em Busca de Igualdade“, abrindo caminho para que as mulheres tivessem voz e atuação de destaque na cooperativa. Desde então, lideranças femininas surgiram, trazendo uma nova dinâmica a outras instituições.
O trabalho realizado pelo grupo Mobi repercutiu além dos limites da cooperativa, estimulando a participação ativa de mulheres nas coops em diferentes níveis. “Hoje, a Coopfam conta com sete conselheiros, sendo quatro diretoras (mulheres) e três diretores (homens), demonstrando o sucesso da abordagem cooperativista inclusiva e igualitária”, avaliou a presidente.
Mais de 50% dos colaboradores são mulheres, ocupando posições-chave na indústria e no controle de qualidade do café, que é exportado para mais de 16 países. “As mulheres também atuam nos conselhos fiscal, de ética e consultivo, reforçando o papel central no desenvolvimento da cooperativa”, afirmou a representante.
OLHAR PARA O FUTURO
A trajetória da Coopfam é um marco na história do cooperativismo de café no Estado. O compromisso com a igualdade de gênero se reflete não apenas na presença de mulheres em posições de liderança, mas também em projetos e ações que visam valorizar o trabalho feminino e fortalecer a cooperativa como um todo.
“O caminho para a igualdade de gênero ainda enfrenta desafios, especialmente na sensibilização e apoio das famílias. É preciso que a comunidade e as famílias compreendam e valorizem a atuação das mulheres no campo”, concluiu Vânia.
Café Feminino: exclusividade e qualidade no mercado cafeeiro
Dayany de Assis dos Santos Ferreira tem 34 anos e é neta de cafeicultores. Na adolescência, trabalhava nas férias no terreiro de café. Depois de adulta e já casada, voltou à zona rural com o esposo, que já produzia café na região.
Há dez anos, Dayany iniciou um curso de artesanato de palha de café e passou a ter mais contato com o grupo de cafeicultoras da Coopfam. Ela ocupava seu tempo livre atuando como artesã. No ano seguinte, ela passou a integrar a coop e, além do artesanato, com o qual já tinha habilidade, lidava com as lavouras, na área de gerenciamento.
Em 2016, Dayany já totalmente envolvida com o ramo cafeeiro, pôde concretizar um sonho: plantar uma lavoura de café feminino. Ela adquiriu uma pequena área de lavoura próxima a sua casa, que havia sido muito castigada pelo granizo e que, por isso, deixou seu antigo proprietário desiludido.
Dayany aproveitou a oportunidade e, em 2017, realizou a primeira colheita do café feminino, em Poço Fundo. Para a surpresa dela, a amostra do café participou do Concurso de Qualidade Coopfam e ficou em primeiro lugar.
Atualmente, a cafeicultora dirige o grupo Mulheres Organizadas em Busca de Igualdade (Mobi). Ela explica como a experiência com o cooperativismo impactou a sua vida e a de sua família.
“A Coopfam transformou minha vida. Quando eu conheci a Coopfam e o cooperativismo de base, raiz mesmo, com toda a dedicação e todo princípio cooperativista, eu fiquei encantada. O café é um instrumento para trabalhar todas as outras coisas que transformam não só pessoas, como propriedades, como a nossa comunidade”, disse Dayany. Com dois filhos e conciliando a paixão pelo artesanato e pelo café, Dayany parte agora para uma nova fase: vai cursar a faculdade de Psicopedagogia.
SELO CAFÉ FEMININO
O selo Café Feminino, criado pela Coopfam, traduz a proposta do trabalho, em sua essência: valorizar a produção eminentemente feminina no setor cafeeiro. São duas linhas de produtos: o Orgânico Feminino e o Sustentável Feminino. Ao todo, 44 cafeicultoras de Poço Fundo produzem 1.400 sacas do Sustentável e 420 do Orgânico.
Uma das paixões de Dayany é o café orgânico. Para ela, produzir causando menos impacto ao meio ambiente, preservando o solo e usando resíduo de outras culturas reforça o valor de sustentabilidade que ela carrega consigo.
Este mesmo Café Feminino Orgânico, inclusive, já é exportado para os Estados Unidos e para a Suíça. As embalagens carregam consigo a identidade, que certifica e qualifica o produto como de fabricação e gestão total das agricultoras mineiras.
“Nosso café tem protagonismo de mulher: mulher inserida, mulher com direitos rurais. Ele é especial porque ele tem uma dedicação e a gente tem um histórico na cooperativa de que os cafés de que as mulheres cuidam no terreiro são melhor classificados. Ele é especial porque tem um carinho e um cuidado especiais no manejo”, pontua a diretora do Mobi.
No conceito, o produto com selo Café Feminino ergue a bandeira de valorização da produção por mulheres e defende a responsabilidade social, sobretudo na defesa da igualdade de gênero.